"Noite Sangrenta" é o último dos projectos de ficção da RTP para assinalar o centenário da implantação da República. Mas é também um episódio quase desconhecido da história portuguesa. E os intervenientes da minissérie - que é emitida ontem e hoje na RTP1, pelas 21h00 - são disso exemplo. "De toda a equipa só uma pessoa, que tinha 80 anos e veio fazer uma figuração especial, é que sabia o que era a "Noite Sangrenta", resume o argumentista Tiago Rodrigues, assumindo que ele próprio desconhecia este acontecimento até começar a investigar. Os actores Isabel Abreu, Gonçalo Waddington e Nuno Lopes, protagonistas da história, também admitem que nunca haviam ouvido falar deste episódio. "Inicialmente achei que era um problema meu, que não tinha estudado bem a história. Depois, percebi que não. Provavelmente, 90% dos portugueses não sabem o que é a "Noite Sangrenta", comenta a actriz, que interpreta Berta da Maia, a personagem central do projecto, a mulher que leva a cabo uma investigação por conta própria para descobrir o mandante do assassínio do marido, Carlos da Maia, e de outros heróis da República na noite de 19 de Outubro de 1921. "É uma mulher à frente do seu tempo. É alguém que vai contra tudo e contra todos, é uma mulher muito à frente", analisa Isabel Abreu, que se surpreendeu quando leu o livro que Berta da Maia escreveu. "Tem ali um tom que se deve à época e à posição da mulher na época", explica, realçando o contraste dessa autocomiseração com a força desta mulher. "Acho que o que ela fez e o que ela era não é aquilo que ela escreve", sublinha. Apesar disso, o livro foi, segundo Tiago Rodrigues, silenciado. "A segunda edição foi tirada de circulação, já o marechal Carmona era presidente da República. Ele que fora o procurador do caso e que parece ter feito uma investigação forte", lembra o argumentista, que também faz uma participação como actor no papel de Fernando da Maia, o cunhado de Berta da Maia, o homem que a acompanha apesar de achar que "nada daquilo vale a pena". Gonçalo Waddington interpreta Abel Olímpio, o marinheiro chefe da milícia que é julgado pelo crime, mas que se recusa sempre a divulgar o nome dos mandantes. As cenas foram gravadas no tribunal militar do Campo de Santa Clara, em Lisboa, local exacto onde ocorreram os acontecimentos há 89 anos. "Encontraram-se fotos e ele era ainda mais magro do que eu", sorri Gonçalo, mostrando o dente de ouro que colocou para compor o personagem. Vestido de marinheiro, Nuno Lopes admite que o figurino o ajuda a situar-se no ambiente dos anos 1920. "É sempre divertido imaginarmo-nos a viver nesta época", admite o actor. "Noite Sangrenta" foi apenas um de quatro projectos de época produzidos praticamente em simultâneo, o que acabou por complicar as coisas. "As armas foram alugadas na Alemanha pelos quatro projectos, mas isso foi um acordo entre as produtoras. Sei que no guarda- -roupa houve alguma competição e que algumas produtoras, quando chegaram a Espanha para alugar a roupa, esta já estava alugada por outras. E que na marcação de filmagens em algumas ruas de Lisboa ou em alguns palácios houve alguma confusão, porque para projectos diferentes e em dias diferentes havia o mesmo espaço, a mesma rua, o mesmo palácio", conta São José Ribeiro, directora adjunta de programas da RTP. "Mas são projectos completamente diferentes. A única coisa que os une é que contam histórias à volta de 1910", acrescenta, referindo-se a "República", "O Segredo de Miguel Zuzarte" e "A Noite do Fim do Mundo", já emitidos. "Foi um grande, grande, grande investimento. É, talvez, e estou há sete anos na RTP, o maior investimento em produção histórica que a RTP fez nos últimos anos", admite a responsável da estação. De valores não fala, mas remata: "São projectos muito caros."
Fonte: DN
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