domingo, 18 de abril de 2010

Rita Blanco de regresso ao teatro

Aquele cabelo comprido, os botins pretos contrastando com a pele branca das pernas, o andar desajeitado. Parece mesmo Amy Winehouse. Mas é Alma, a personagem principal de "Miserere", o espectáculo que a Cornucópia estreou no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa. As semelhanças com a cantora de "Rehab" não são inocentes mas também não são intencionais: "Tinha a ideia de uma pessoa inadaptada e nesse aspecto talvez tenha a ver com Amy Winehouse. Mas é muito mais do que isso", explica a actriz Rita Blanco. "Ela é uma ingénua. Alguém que cai num sítio cheio de regras e que desconhece essas regras. E que é completamente engolida pela pressão dos outros. Acaba por desistir e percebe que a única hipótese que tem é aceitar uma culpa que não é sua." Esta é "Alma do Auto da Alma", escrito por Gil Vicente por encomenda de D. Manuel I para ser apresentado antes da Páscoa, em 1517. "Fazem-lhe uma lavagem ao cérebro, ela é obrigada a afastar-se de tudo o que é sensorial", acrescenta o encenador. "Dos prazeres da carne." "Esta é uma peça sobre a culpa, a mortificação do ser humano e o caminho para a redenção, e dá- -nos uma visão do cristianismo muito cruel e triste, que não me interessava. Interessava-me antes falar da misericórdia e da generosidade de Deus", explica Luís Miguel Cintra. "Quero mostrar que se há Deus, que tenha misericórdia de nós por não sabermos o que fazemos ao tratar mal uma coisa tão preciosa quanto a vida humana." O encenador explica que optou por "profanar" a intenção original do autor "para procurar um novo sagrado, uma nova transcendência", diferente daquela que herdou na sua educação cristã. "Só voltaria a fazer Gil Vicente pela mão do Luís Miguel, que é uma pessoa extraordinária, que se entusiasma e nos entusiasma. Parece um miúdo a trabalhar", conta a actriz. Foi com a Cornucópia que, em 1983, Rita Blanco se estreou no palco, na peça "Mariana Espera Casamento". De vez em quando, a actriz regressa a casa. "Para mim isto não é fazer teatro, é algo pessoal. Nesta peça estou completamente exposta. Para um actor, isso só é possível quando se ama as pessoas com que se trabalha e se confia inteiramente nelas", diz Rita Blanco. "Não me interessam os papéis. Interessam-me as pessoas." Em "Miserere", a actriz leva bofetadas e beijos, despe-se e até imita Cristo. "O teatro para mim é muito doloroso porque gosto de me enfiar toda lá dentro." No cenário sempre fabuloso de Cristina Reis, Rita Blanco contracena com João Grosso, José Airosa, Luís Lima Barreto, Ricardo Aibéo, Sofia Marques, Dinis Gomes, José Manuel Bento, Vítor D'Andrade, Duarte Guimarães e Luís Miguel Cintra. Com o "Auto da Alma" e outros textos de Gil Vicente, o espectáculo fica em cena no Teatro D. Maria II até 23 de Maio.
Fonte: DN

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