Um espectáculo de Maria Emília Correia, simultaneamente belo e estranho, que apela à acção política. Dario Fo escreveu e reescreveu o original "Não se Paga! Não se Paga!", de 1974, até chegar a "Não se Ganha, Não se Paga!", um texto cuja acção decorre em plena crise globalizada, onde se fala constantemente da deslocalização dos centros de produção para países de leste ou asiáticos, onde os empregos escasseiam e os que existem são precários, onde os direitos daqueles que trabalham desaparecem a ritmo acelerado. A encenação de tal texto foi entregue a Maria Emília Correia, uma criadora de imaginação delirante que funciona no seu melhor com textos poéticos e que aqui voltou a usar as suas referências para assinar um espectáculo de deslumbre estético. Visualmente, "Não se Ganha, Não se Paga!" vive de um cenário quase expressionista, uma estrutura metálica em permanente desequilíbrio (Rui Francisco) e dos figurinos coloridos de José António Tenente, que concebeu fatos cujas cores que se harmonizam num todo agradável. Dentro deste universo, os actores funcionam em registo farsesco, num tom quase revisteiro, fazendo o público rir à gargalhada em várias ocasiões. O elenco – composto por Cristina Cavalinhos, Luís Gaspar, Lucinda Loureiro e Horário Manuel – consegue oferecer-se como um todo mais ou menos equilibrado, mas é Rogério Vieira quem mais brilha. Não estávamos habituados a vê-lo num registo tão abertamente cómico, com o desafio extra de ter de se desdobrar por várias personagens. A música original de Tiago Derriça – interpretada ao vivo por Iryna Brazhnik e Ricardo Torres – é uma das mais valias desta produção, conferindo ao espectáculo alguma unidade. No geral, "Não se Ganha, Não se Paga" é um espectáculo desconcertantemente divertido, que alterna diálogos hilariantes com discursos politicamente pertinentes e que surpreende: fazer apelo à acção política directa em roupa de ‘designer’ não deixa de ser inédito. Ver até 28 de Março, de quarta a sábado às 20h30, domingos às 16h30.
Fonte: CM
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