quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Mariana Rey Monteiro: a dama do teatro

Para quem tenha memória curta (ou idade curta), o nome de Mariana Rey Monteiro aparece conotado com uma série de retratos de matriarca ("Vila Faia" é o exemplo inaugural e paradigmático), uma espécie de rainha-mãe da telenovela. Nada de mais injusto: Mariana Rey Monteiro é um "bicho de palco", a maior actriz da sua geração, deveria ser, num país normal, um mito vivo. Maria, nunca se lhe deu o que lhe era devido por mais de 30 anos de actividade ininterrupta nos palcos: desde a "Antígona" (1946) que Júlio Dantas "refez" para ela e que Hermínia Silva parodiaria de forma genial na revista "Sempre em Pé", do mesmo ano ("Sem querer recito a 'Antígona' em calão"), até "Filhos de Um Deus Menor", já quase em participação especial. Pelo caminho, uma carreira extraordinária de mais de 50 peças, só na companhia do Nacional, no Rossio ou nos seus vários exílios: Oscar Wilde ("O Marido Ideal", 1946), Shakespeare ("Sonho de Uma Noite de Verão", 1952; "Romeu e Julietâ", 1961; "Macbeth", 1964), Molière ("Tartufo", 1963), Ibsen ("Hedda Gabler", 1972) e Gil Vicente, Shaw, Santareno, Pirandello, Mrozek, Albert Camus, Valle-Inclán ou lonesco.A sua pose distante e moderna em palco, uma voz bem timbrada e belíssima, com uns graves inesquecíveis, faziam dela a intérprete ideal das grandes heroínas do teatro americano de que tem que destacar-se a Blanche Du Bois de "Um Eléctrico Chamado Desejo" (1963) de Tennessee Williams, uma das primeiras vezes que tivemos a sorte de a ver em palco, desgarrada e trágica com a dignidade aristocrática que a personagem exigia e a actriz possui naturalmente. Mas há também Arthur Miller ("As Bruxas de Salém", 1957, ou "Do Alto da Ponte", 1960) e o desvario controlado e genial em "Equilíbrio Instável" (1967), de Albee. No entanto, quando se fala de Mariana Rey Monteiro o que conta é a emoção de a ver chiquíssima em "Rosas Vermelhas (1965) ou mulher do povo em "Filomena Marturano" de De Filippo. A versatilidade é, aliás, uma das suas características, capaz de todos os registos, como atesta a sua "humilde" criada na série televisiva "Gente Fina É Outra Coisa", uma das poucas (ínfimas) memórias para a posteridade de uma mulher fabulosa, que fez do palco e da transitoriedade do grande teatro a sua vida. Porque tem a humildade das grandes actrizes, nunca quis ser diva. Mas acredite quem nunca a viu sobre os palcos: quando entrava em cena era magnética e maior do que o mundo.
Fonte: Público

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